quarta-feira, 20 de abril de 2011

1999

Quanto mais se vai falando de 25 de Abril, menos se vai falando do 25 de Novembro. E vai-se inulcando no espirito das pessoas a ideia de que este regime de inaugurou com o 25 de Abril. E tudo o que agora temos, bom e mau, é produto desse 25 de Abril. Haveria toda a vantagem em fazer uma distinção e dizer às pessoas que a democracia oficial está a apagar os "vestígios do crime". Não seria demasiado falar numa prostituição do 25 de Abril, na medida em que tudo aquilo que teve de criador, de democracia das massas trabalhadoras, hoje é apresentado como uma aberração, o anarco-populismo, o PREC, uma espécie de excerescência que apareceu mas que depois bateu em retirada.
Não, apareceu um regime com uma burguesia tornada extremamente vulnerável porque tinha aderido durante quase 50 anos ao regime fascista. Inicialmente, houve uma oposição, mas, durante bastantes anos, o grosso da burguesia aderiu, aceitou, colaborou com esse regime fascista. Forçosamente, ao chegar ao fim, viu-se em fortes dificuldades, e isso permitiu criar um regime com estas características novas. Aquilo que foi criado entre o 25 de Abril e o 25 de Novembro não são aberrações, não é terror anarco-populista, não é nada dessas calúnias lançadas, mas criações que eu acho que têm futuro (embora hoje sejam difamadas), porque a situação que temos não é o fim da história. As ocupações, as comissões de trabalhadores, as comissões de soldados, a liberdade nos quartéis, a liberdade dos trabalhadores, as assembleias, vão ressurgir, porque os povos têm a sua memória histórica. Numa nova situação de crise deste sistema, esse tipo de realizações é um capital, vá lá, a palavra não é muito boa, mas é um capital adquirido que vai surgir novamente.

Francisco Martins Rodrigues, entrevista à História, nº13 Abril 1999

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